sexta-feira, 5 de agosto de 2011

LAÇOS DE AFETO (CONTINUAÇÃO)


Capítulo 28

Auto-Amor

Se o Espiritismo, conforme foi anunciado, tem que determinar a transformação da Humanidade, claro é que esse efeito ele só poderá produzir melhorando as massas, o que se verificará gradualmente, pouco a pouco, em conseqüência do aperfeiçoamento dos indivíduos.”

O Livro dos Médiuns capítulo 29 — ítem 350

“Ser” - verbo que traduz o anseio evolutivo de existir em plenitude, feliz, dirigindo-se para Deus.

Escolhas malsucedidas, no entanto, afastaram-nos desse finalismo Divino, aprisionando-nos nos charcos asfixiantes da prova, da dor e do hábito infeliz.

O voluntário esquecimento de nossos deveres no peregrinar das reencarnações trouxe-nos de volta, na atual vivência carnal, o fruto amargo das semeaduras infelizes que plantamos sob a volúpia das ilusões.

Hoje, graças a esse descuido milenar, existe um abismo de sombras entre o “eu Divino” e a nossa realidade existencial, onde se acomodam os monstros do orgulho e do egoísmo.

Apesar da condição desditosa, a inesgotável Providência Divina estende-nos um aluvião de recursos de amparo em favor de nosso reerguimento, perante a própria consciência. O encontro com as diretrizes espíritas é um exemplo disso. Agora, iluminados pelos princípios estruturais do Espiritismo, somos novas criaturas em busca do Pai que “abandonamos”.

Sentir Deus! Eis o fundamento da transformação interior.

Renovar a forma de sentir é a senda libertadora em favor da auto-recuperação espiritual.

Conquanto as luzes que clareiam os raciocínios, ainda sentimos o peso coercitivo dos resultados da insanidade moral nas impérvias sentenças que lavramos contra nós no dobar do tempo. Os propósitos superiores de agora parecem ser esmagados ante a força cruel do passado ignominioso e voraz que reside nos porões da mente.

Desejos fugazes do bem consomem-se sob a mira certeira de sentimentos que não gostaríamos de sentir.

Desejamos amar a família, mas, muita vez, sentimo-nos manietados a estranhas fantasias que nos inclinam para a ilusão dos sentidos fora do lar.

Desejamos compromisso e louvor ao serviço doutrinário, todavia, em várias ocasiões, sentimo-nos vazios de idealismo, tombando nas armadilhas do desânimo e da deserção ou enredados na rotina de realizar por obrigação, sem gratificações de profundidade.

Desejamos a conduta moral elegante, contudo, muitas vezes, “vozes interiores” vaticinam culpas e limitações, levando-nos a acreditar em muralhas de imperfeições que jamais conseguiremos transpor.

Desejos louváveis não se harmonizam com os velhos sentimentos de cada dia. Expiação maior não pode existir, para o aprendiz sincero do Evangelho, qual a de ter os novéis e frágeis propósitos agredidos pelos libelos que a própria consciência inflige em razão de nosso ontem.

O bem que desejamos nem sempre conseguimos viver e manter, menos ainda senti-lo. Porém, tenhamos vigilância e fé. Essa é a trajetória “natural” de regresso ao encontro do ser.

Existir para Deus, em nosso caso, implica vencer todas essas “expiações do sentir”, palmilhando as veredas reeducativas da atitude em favor do renascimento do ser glorioso e magnânimo ergastulado sob a canga de nossas mazelas.

Jamais desistamos desse compromisso, pois que, inexoravelmente, esse “reencontro” se dará em algum momento, já que é um fatalismo das Leis Naturais e Universais.

A melhor opção nessa retomada espiritual é o amor na busca das expressões celestes adormecidas em nós. Referimos ao amor a si mesmo, contemplado por Jesus na essência de sua plataforma para a felicidade.

Nós, os espíritas, temos feito progressos consideráveis no que tange ao amor ao próximo, erguendo trincheiras do bem e da caridade. Temos produzido e realizado fartas semeaduras de bênçãos junto aos grupos de amor. Raras vezes, entretanto, temos sabido amar a nós próprios.

E existirá Amor maior a si que esse de saber lidar com essas sombras interiores que tentam empanar nossos anseios de Luz?

Aprendamos esse amor e sejamos mais felizes.

Amar nossa “sombra’, conquistando-a paulatinamente.

Tolerar nosso passado, sem as impiedosas recriminações.

Amar-nos, apesar do nosso passado de escolhas infelizes e decisões precipitadas, é fundamental para encetarmos um recomeço de vida espiritual rumo à liberdade.

Aprender o auto-amor é arar a terra mental para “ser”. Quando o lograrmos, recuperaremos a serenidade, o estado de gratificação com a vida, a compreensão de nós mesmos, porque o sentimento será então um espelho translúcido das potencialidades excelsas depositadas em cada um de nós pela “inteligência suprema do universo”.

Formou-se entre nós uma lamentável “cultura de sofrimento” fundamentada na Lei de Causa e Efeito, propalando a dor como situação insubstituível ao progresso. Acentua-se tal teoria com a supervalorização de fantasias sobre um passado de outras vidas no qual são destacados crimes e desvarios. As conseqüências de tal enfoque podem ser sentidas no quadro de baixa auto-estima e desacordo consigo mesmo em que se encontra grande parte do discipulado espírita.

Alimentando crenças de desmerecimento e menosprezo mais não fazemos que desamarmo-nos e impedir o crescimento pessoal e grupal.

O pior efeito de semelhante quadro psicológico é acreditar que não merecemos ser felizes, automatizando um sistema mental de cobranças intermináveis e uma autoflagelação, ambas, em várias ocasiões, sustentadas e induzidas por adversários espirituais astutos e vampiros da morbidez das sensações, gerando situações neuróticas de perfeccionismo e puritanismo quase incontroláveis.

Esse autodesamor é um subproduto do atávico religiosismo que edificamos no psiquismo, em séculos de superficialidade moral, cuja imagem condicionada na vida mental foi a de um ser pecador e miserável, indigno daquele paraíso onde esperávamos refestelar-nos com as vantagens dos céus. Ainda sob a forma de potente condicionamento, transpomos para as ambiências espiritistas tais reminiscências do “eu pecador”.

Allan Kardec assinala que o “aperfeiçoamento individual” é o fermento das transformações sociais, e isso exige cuidados pessoais dos quais, alguns deles, só dispensaremos ao outro na medida em que os aplicarmos a nós, sem que isso, em momento algum, signifique vaidade e preocupação personalista.

* * * *

Coração querido,

Piedade e complacência contigo mesmo.

Estais em lutas acerbas a ponto de desistir? Persevera e luta.

Busca na prece o que te falta: a força para continuar.

Caridade contigo é o desafio do auto-amor.

Sentes no imo da alma uma amargura incomensurável ante as faltas e deslizes a que descuidadamente te permitiste. Um sentimento avassalante de indignidade toma-te a alma, quando fazes o que não deverias ou deixas de fazer o quanto deverias. Conquanto as lutas, cuida para que essas sombras não empanem o brilho de Deus em ti, e confia na bondade do Pai que te confiará o necessário para a caminhada.

Vigia teu mundo emotivo. Ninguém é indigno de Deus, em situação alguma, ainda mais agora que já te encontras com rumo e norte para recomeçar.

Perdoa-te quantas vezes forem precisas e retoma teu programa de luz.

Sentir-se indigno da Bondade Paternal é sintoma de melhora e sinceridade de tua parte. Pior seria se errasses novamente e acolhesses com inconsciência a tua escorregadela infeliz.

Ainda te ocorrerá inúmeras vezes esse incômodo que, por fim, é o “anjo vigilante” de tua consciência advertindo-te com esse mal-­estar para que não sucumbas outra vez na mesma furna de invigilância.

Aceita-te tal qual és e prossiga.

Não asiles em ti o sentimento de hipocrisia induzido pela hipnose do orgulho, que tentará de todas as formas fazer-te desacreditar das escolhas ainda vacilantes e pouco sólidas na tua nova caminhada. Hipocrisia existe quando o desejo e a atitude são precedidos pela intenção deliberada, em contraposição ao que já conheces.

Logo mais, respeitando as investidas de tuas sombras, a quem deves também amar, perceberás a transformação e animar-te-á pelo esforço e sacrifício empenhados.

Desistir, nunca!

A auto-recuperação é um leito de convalescença na enfermaria da vida, exigindo teus cuidados sem interrupção.

Um dia, o curativo da oração. Outro, a injeção do ânimo. Em outro mais, a medicação amarga do enfrentamento de tuas doenças. Ainda à frente, a imperiosa necessidade do esculápio na pessoa de um amigo para orientar-te.

Terás recaídas, febres de ilusão, dores do desapego, cansaço de ansiar pela melhora, incômodos na cama das provações diárias, dificuldades para com necessidades básicas, o sono indisciplinado trazendo fadiga, o alimento que não desejarias causando-te a fome de esperanças, o banho limitado impedindo-te a sensação de leveza e bem-estar.

Apesar disso o tratamento está se concretizando, ainda que não percebas.

Por isso tenha paciência contigo, e não pare de amar-se.

O amor a si mesmo é uma lição profunda e difícil, porém, não impossível.

Comece já teu ministério de auto-amor e constatarás que esse aprendizado é a condição essencial na existência para o tão decantado amor ao próximo.

Convivendo bem contigo, serás bom companheiro e amigo de teus grupos espirituais, fazendo-te mais útil nas mãos da vida, para o cumprimento da Lei da felicidade na melhoria social, em torno dos teus e dos passos alheios.


Capítulo 29

Harmonização e Segurança

Nos agregados pouco numerosos, todos se conhecem melhor e há mais segurança quanto à eficácia dos elementos que para eles entram.”

O Livro dos Médiuns capítulo 29 — ítem 335

Remanescente de eras primárias do evolar humano, trazemos ainda hoje como reflexo marcante e dinâmico o vício da posse, como sendo complexo mecanismo desenvolvido pela alma na busca de segurança.

Agrilhoado a milenares impulsos da vida corporal, na medida em que adquire a razão, passa o homem a ter o instinto de posse não mais como motivação para buscar o atendimento de necessidades básicas, mas como garantia de bem-estar ante os desafios ameaçadores da vida e da estabilidade em sua jornada.

Acumular passa a significar proteção e defesa, e por longas e repetidas vezes o estágio nessa atitude conduziu a mente a fixar os valores da soberba, da tirania, da ilicitude e da ganância na direção dos excessos.

Hoje, quando nos referimos à segurança e à preservação, necessariamente associamos esses sentimentos a medidas exteriores tais como riqueza, dotes sociais, beleza e conforto, que são ícones para questões interiores no campo do existir humano.

Tais manifestações que ensejam a fugaz sensação de segurança e paz interior são fortes ilusões, escravizando a mente a padrões de comportamentos e “alijando” da alma a expressão do afeto isento das cargas emocionais primárias e empobrecidas de autêntico Amor.

Essa vivência da evolução permite-nos tecer considerações oportunas a nossa convivência, uma vez que segurança é o que mais almejamos junto àqueles com os quais partilhamos nossas vidas. Na ausência desse sentimento instala-se, ocasionalmente, o reflexo da injustiça, e o sentimento de injustiça é o desajuste do afeto que leva o coração a disparar a rebeldia, a mágoa e o ódio como hábitos longamente cultivados desde tempos imemoriais.

Asilando esse “sentir-se injustiçado” que se efetiva para cada individualidade, conforme seu temperamento e caráter, estabelece-se a desarmonia da razão que pode levar à adoção de ações reflexas desde a ira até o crime “não intencional’.

Em verdade, estamos estudando a intensa “capacidade de destruição” que tem o egoísmo, o qual nos é próprio no atendimento ao instinto de conservação natural. Instinto esse acrescido pelos excessos adquiridos em milênios de orgulho e vaidade, saciedade e ambição.

Não foi sem motivo a conhecida lição de Jesus, prevendo acontecimentos para os dias atuais, quando disse: “E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor de muitos esfriará”. (1)

Injustiça sentida, afeto embotado.

Muita vez, essa busca de segurança tem conotações sutis nas ações que carecem ser compreendidas, a fim de melhor nos posicionarmos uns frente aos outros. A necessidade de domínio e controle é outra forma costumeira de apresentar-se, seja no lar ou na profissão, na amizade e, igualmente, nas movimentações doutrinárias.

Ocorre que, quase sempre, onde tais sentimentos de posse comparecem, morrem a fraternidade e as relações ricas de permuta afetiva.

Controle e domínio, quando surgem em nossas lides, travestem­-se em normas e planos coletivos, hierarquia e interesses de grupos, sob a chancela de missões necessárias ou diretrizes de Mais Alto ao bom andamento dos destinos do Espiritismo ou no alcance de objetivos grupais e institucionais.

O resultado inevitável, nessas condições sociais, é a poda de valores substancialmente essenciais ao resgate do espírito da simplicidade, da despretensão e do respeito com o qual deveríamos tratar os assuntos da doutrina e, igualmente, a indiferença, o descrédito e o desamor com os quais tratamos uns aos outros nos assuntos da vida interpessoal. Tudo para sentir a segurança do controle das rédeas que, por sua vez, oferece a sensação de posse e realização pessoal.

Marca comum a grande maioria dos que se aferram a esse capítulo do egoísmo é o afastamento escolhido das necessidades humanas, no campo do amparo e da solidariedade, enquistando o coração na “frieza afetiva”, em crises de racionalização.

Por isso, se verdadeiramente queremos segurança e estabilidade, busquemo-la na vivência do afeto, e afeto não se desenvolve sem convivência e proximidade, sem permuta e disposição de aprender, sem servir e trabalhar. Eis porque as atividades assistenciais de nossa Seara, entre inúmeras vantagens, propicia ao homem solitário e inseguro vigorosos estímulos não encontrados em quase nenhuma experiência social.

Insistimos na vivência do afeto nos grupamentos da nova revelação, porque essa relação assegura a essência do Espiritismo em nós, o Amor.

Labutemos juntos pela humanização de nossas lides, para não nos perdermos em movimentações exteriores e improfícuas.

Amar a Casa mais que a Causa é “delírio” de nossa afetividade que acumula tesouros na terra onde as traças e a ferrugem tudo consomem(...)(2)

O afeto é o tempero das tarefas imunizando-nos contra excessiva valorização dos métodos, das formas e das condições de realizá-las, centrando nossas aspirações no ser humano que dela participa sem fascínio com a teoria, com os conflitos, com os problemas comuns a essas iniciativas. Quando nosso foco é o próximo e a necessidade de servir e aprender, nossos sentimentos serão excelente garantia de boa aplicação e aproveitamento nas atividades que cooperamos.

Evidentemente, com isso, não queremos incentivar a desorganização e os descuidos necessários ao bom andamento de nossos projetos de amor.

A clareza de Jesus em destacar que seus discípulos seriam conhecidos por muito se amarem (3) não deixa margens a dúvidas sobre as anotações que ora descrevemos.

Perambular pelas adjacências das proposituras espíritas será forte tendência de todos nós, Espíritos em busca da remissão consciencial. Entretanto, os conteúdos exarados pela “Plêiade Verdade” são por demais esclarecedores ao assinalar que a caridade, entendida como o sublime mecanismo de intercâmbio e solidariedade relacional, é a prioridade de nossos projetos espirituais em quaisquer formas como se estruturem.

Humanização da Seara, eis a meta!

Sem caridade não teremos jamais a educação, e sem educarmo­-nos fugimos do objetivo primacial do Espiritismo e iludimo-nos com o velho instinto de posse no acúmulo de vitórias transitórias junto aos púlpitos do verbo eloqüente, do assistencialismo superficial, do controle personalista, em improdutiva atividade a qual, inadvertidamente nomeamos como sendo trabalho, zelo e dedicação, e terminamos afogados no fascínio sobre os méritos pessoais, em sofrível crise de personalismo...

Não é por Outro motivo que aqui, nos planos da vida imortal, lamentavelmente temos amparado em nome do Amor muitas almas distraídas de seus deveres, junto aos campos do serviço espírita da Terra. Carreiam para cá extensa quota de enganos acerca de sua realidade espiritual, supondo-se, em grande maioria, detentores de cabedais ou créditos que não fizeram por merecer. Justificando medidas e ações, decisões e escolhas, com “criativo’ e frágil desculpismo e dotados de arrogância e autoritarismo, quando percebem que não se encontram na vida espiritual tão seguros quanto pareciam no mundo físico, descobrem, pouco a pouco, as vertiginosas armadilhas que desenvolveram contra si próprios, passando por longo estágio de perturbação e inconformação até resgatarem a humildade, para reconhecerem que, em verdade, serviram a si mesmos e não ao Senhor da Vinha, amargando doloroso sentimento de culpa e arrependimento que, somente em novas e mais promissoras oportunidades, em outras reencarnações, poderão expurgar a preço de testemunhos e dores, labor e esforço, na conquista do triunfo sobre si.

Segurança, portanto, é sinônimo de “acúmulo” de bens interiores. Talvez por isso Allan Kardec considera em nosso tópico de análise que há mais segurança quanto à eficácia dos elementos que compõem agregados menos numerosos, deixando entender a importância de relações sólidas, sadias e venturosas para o bem de todos. Cria-se assim melhores condições para uma lídima segurança, em razão de permitir-nos maior introspecção que identifique necessidades de profundidade e, também, dilatarmos o patrimônio da cooperação uns com os outros, ante a extensão de nossas mazelas milenares.

Busquemos a segurança, a conservação íntima e pessoal no bem do próximo, pautando nossas vidas pela abnegação e devotamento.

Sigamos em nosso favor as felizes recomendações da questão 922 de O Livro dos Espíritos, estabelecendo-as como os pilares de uma reencarnação segura e vencedora:

“A felicidade terrestre é relativa à posição de cada um. O que basta para a felicidade de um, constitui a desgraça de outro. Haverá, contudo, alguma soma de felicidade comum a todos os homens?

Com relação à vida material, é a posse do necessário. Com relação à vida moral, a consciência tranqüila e a fé no futuro.”

(1) Mateus, capítulo 24, versículo 12

(2) Mateus, capítulo 6, versículo 19

(3) João, capítulo 13, versículo 35


Capítulo 30

Educandário do Amor

Para o objetivo providencial, portanto, é que devem tender todas as Sociedades espíritas sérias, grupando todos os que se achem animados dos mesmos sentimentos. Então, haverá união entre elas, simpatia, fraternidade, em vez de vão e pueril antagonismo, nascido do amor-próprio, mais de palavras do que de fatos; então, elas serão fortes e poderosas, porque assentarão em inabalável alicerce: o bem para todos; então, serão respeitadas e imporão silêncio à zombaria tola, porque falarão em nome da moral evangélica, que todos respeitam.”

O Livro dos Médiuns capítulo 29 - ítem 350

Os exercícios de caridade promovidos pelos nossos núcleos espíritas são ocupações de relevância em um mundo como a Terra.

Pessoas que até ontem se importavam somente consigo mesmas, em atitudes de egoísmo e desonestidade, muita vez, encontram nos serviços da benemerência e da caridade o conforto que suas almas perderam há séculos. Ensaiam e treinam, através dos atos de solidariedade e doação, os novos sentimentos que, no futuro, passarão a integrar melhores roteiros de sua caminhada espiritual. Por isso, quaisquer programas de apoio e sustentação, assistência e amparo são nobres iniciativas que a casa espírita pode erguer a bem, sobretudo, de quem tomará sobre si a oportunidade de cooperar.

Nesse sentido, o centro espírita, em suas feições de hospital da alma e oficina de trabalho, na missão de auxiliar e amparar, é das mais enobrecedoras instituições do orbe.

Contudo, após mais de um século de Espiritismo, é chegado o instante azado para aprimorarmos as concepções acerca do papel do centro espírita para quantos lhe comungam a rotina, dilatando sua finalidade e situando-o como educandário do Amor, cujo objetivo precípuo seja a formação do homem de bem.

Conquanto as respeitáveis conquistas efetuadas pelas nossas organizações, ninguém tem dúvidas do quanto ainda temos por melhorá­las no que tange às suas possibilidades na esfera da educação e da instrução, promovendo seus trabalhadores, pelo buril da renovação, à condição de “reciclagem moral” no seu caráter e no desenvolvimento de seus potenciais afetivos.

As últimas descobertas científicas, fruto de pesquisas sérias nas áreas psicológicas e neurológicas, apontam para o “analfabetismo emocional” da humanidade, reformulando o paradigma do sucesso e da inteligência humana, deslocando-o do raciocínio para a emoção.

Psicólogos eminentes destacam a necessidade de uma educação voltada para a “inteligência emocional” consentaneamente à instrução intelectiva ou cognitiva, demonstrando, por estudos, que criaturas as quais administram melhor seus sentimentos têm maiores probabilidades de sucesso e equilíbrio nos trâmites da vida.

Perfeitamente afinada com a propositura educacional do Espiritismo, essas “revelações” incentivam que o centro espírita seja um ambiente que alfabetize a razão e igualmente o coração.

Nenhuma instituição humana está tão aparelhada de teoria para atender as necessidades humanas quanto o centro espírita que se rege pelos lídimos postulados da Codificação Kardequiana e o Evangelho de Jesus.

Fazer melhor aplicação desses recursos, principalmente para os que lhe fruem os deveres, dia-a-dia, constitui o desafio para o momento nessa tarefa de promover as atividades doutrinárias ao patamar de programas de educação e elevação do amor humano.

Basta rápido olhar e perceberemos os irmãos de ideal sofrendo a “síndrome de ser amado” em pleno trabalho de amor ao próximo.

Busca-se o bem e ajuda-se o necessitado em ações de renúncia e esforço, deslocando-se quilômetros para beneficiar assistidos, todavia, nem sempre se é caridoso e afetuoso com aqueles que estão próximos e partilham conosco as alegrias do trabalho cristão, deixando uma vasta lacuna nas relações entre os co-idealistas.

As relações superficiais têm como principal reflexo a “solidão em grupo”. Constatamos inúmeros casos dessa ordem em nossa Seara. Essa solidão injustificável é semelhante ao viajante no deserto que, tendo sede, encontra um oásis; no entanto, opta pela inércia e esconde-se, apesar de sua necessidade, temendo bebericar uma água envenenada ou ser surpreendido com a presença de assaltantes naquele lugar.

O centro espírita, esse oásis de luz espiritual, quase sempre, tem sido “lugar de temores”, de “esconderijos emocionais”. O próprio orgulho, nosso velho inimigo, tem provocado esse afastamento quando elabora auto-imagens de perfectibilidade e perfeccionismo nos seareiros. Com esse conceito de si, temem por se expor moralmente, escondendo-se em “carapaças” de falso equilíbrio para que os outros não lhe conheçam as limitações interiores. Sendo assim agem como bons espíritas para os outros, deixando-se à míngua. “Amam” o próximo e desamam a si próprios.

O tempo converte essa situação em inevitável hipocrisia e/ou puritanismo, minando as resistências morais e levando seus portadores à obsessão sutil e infelicitadora, que faz suas vítimas crerem que algumas “concessões” da conduta podem ser compensadas com os serviços no bem. A partir de então são criados complexos mecanismos na desestruturação lenta e gradativa da vida íntima. Nesse emaranhado mental perde-se a noção do verossímil e vive-se uma realidade sob a tutela de forças sombrias.

Somente o diálogo franco seguido da firme disposição de mudar pode alterar os rumos de tais quadros.

Nesse comenos chamamos a atenção de grande parte de nossos dirigentes espíritas que têm ouvido e amparado muitos corações, não possuindo, por sua vez, quem lhes possa orientar ou avaliar seus esforços. Sozinhos, sentindo-se na obrigação de darem o melhor de si, terminam por chafurdar-se em posturas de aparente vitalidade moral; entretanto, seu mundo interior, freqüentemente, deambula para as fronteiras com o colapso da sua saúde mental e afetiva.

Embora destaquemos a feição de escola de Espiritismo em nossos celeiros doutrinários, chega o momento de promovê-los a essa condição de cátedra para educação do afeto cristão, uma “escola do Espírito”, sem o que o conhecimento tornar-se-á diretriz para os raciocínios, deixando o coração desprovido do alimento das emoções nobres, compartilhadas por uma convivência educativa e geradora de estímulo para os ideais de progresso.

A convivência espírita, que deveria ser mais plena e rica de amor, nem sempre tem correspondido às esperanças de muitos corações generosos e sinceros, dispostos a trocas enriquecedoras nos campos do coração que, por desídia e descuido, terminam por arrefecer seu afeto criando para si aquele calabouço desprezível das relações superficiais.

Nossas ambiências apelam para a necessidade imperiosa de um intercâmbio saudável através de abundante afeto cristão, por mais alegria, com a necessária disciplina, por mais sorrisos e instantes de descontração com a precisa integridade e pela coragem de amar como, se deve em substituição ao nosso “amar como se quer”, que, em verdade, é o doentio “querer ser amado”.

Fechar o coração aos ditames do amor é oportunizar riscos reais e perdas possíveis.

Amemos com o Evangelho.

Amemos com o Espiritismo.

Nada deve nos deter nessa marcha.

Promovamos nossas Casas à condição de educandários de amor, exemplificando aos nossos companheiros de jornada que o conhecimento espírita na prática é o Amor em dinamismo.

Nossas lideranças estejam conscientes de suas responsabilidades e tonifiquem a crença no Amor em atos de lisura moral e amizade cristalina, que sirvam de referências saudáveis aos que chegam ávidos de atenção e amor.

Sejamos afetuosos uns com os outros e não tenhamos receio de demonstrar por palavras e atitudes as expressões superiores do que sentimos, ainda que não sejamos prontamente entendidos ou mesmo correspondidos.

Se nos perguntarem se o afeto tem limites, responderemos dizendo que o limite do afeto é o dever e a integridade moral que são suas bases, pois, passando disso, não é afeto e sim desejo, e nossos desejos nem sempre são afinados com os propósitos maiores que só o Amor verdadeiro pode lhes conferir.

Se não tentarmos, jamais aprenderemos.

Se não começarmos, jamais saberemos como fazer.

Não tenhamos medo de amar e a vida nos responderá com lições preciosas no nosso reencaminhamento para aplicar a força do Amor no bem de todos.

Jesus, o Emissário Divino, estabeleceu para os seus discípulos o Amor como sendo a religião cósmica que deveriam seguir, e até hoje ecoa altissonante em nossas vidas os seus dizeres inesquecíveis que nos convocam a uma vida plena de afeto:

“Nisto todos reconhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”(1)

(1) João, capítulo 13, versículo 35


Apêndice 1

Campanha pelo Amor

“Em Laços de Afeto damos nossa contribuição despretensiosa pela instauração de uma campanha pela humanização nas instituições terrenas. Dirigimos nossas reflexões ao centro espírita, conquanto a família e a escola, as empresas e órgãos públicos, e ainda quaisquer ambientes onde os relacionamentos encontrem-se voltados a um objetivo comum são como “terra fértil”, que guarda projetos de ascensão e paz a serem direcionados para o amor uns com os outros, no engrandecimento da evolução espiritual da individualidade. Por divisa tomamos a frase lapidar de Jesus para ser o archote desssa campanha que urge: Nisto todos reconhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros. (1)”

A vitória sobre o maior inimigo do homem, o egoísmo, solicita a renovação dos modelos institucionais e a transformação do comportamento na aquisição de novos valores que o capacitem para longa batalha interior. Recriar as relações e repensar a sistematização das nossas organizações espíritas são investimentos sólidos, que atendem ao programa inspirado sob a tutela do incansável Bezerra de Menezes, no atendimento às “novas determinações” do Espírito Verdade, a fim de construirmos, no futuro, um movimento espírita plenamente identificado com a mensagem de Amor trazida por Jesus à humanidade há dois milênios, e atualizada pelo trabalho nobre de Allan Kardec.

Esperançosa em ter colaborado, mesmo que palidamente, com esse objetivo de instaurar um novo tempo para nossas agremiações, muito nos alentará saber que nossas palavras, pelo menos, serviram para deixar claro que a grande causa de nossas vidas é o amor uns pelos outros, acima de quaisquer postulados de caráter doutrinário ou religioso, conforme já fora asseverado pelo Pastor de nossas vidas:

Meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem.

Ermance Dufalx

(1) João, capítulo 13, versículo 35


Apêndice 2

Programa de Bezerra de Menezes pelos Valores Humanos no Centro Espírita

“A melhor campanha para a instauração de um novo tempo na Seara passa pela necessidade de melhoria das condições do centro espírita, que é a célula operadora do objetivo do Espiritismo. Lá sim se concretizam não sóo conhecimento e o trabalho, mas a absorção das verdades no campo individual consentidas em colóquios íntimos e permanentes, que reproduzem os momentos de Jesus com seu colégio apostólico.

Por isso, temos que promover as Casas, de posto de socorro e alívio a núcleo de renovação social e humana, através do incentivo ao desenvolvimento de valores éticos e nobres capazes de gerar a transformação.

Para isso só há um caminho: a educação.

O núcleo espiritista deve sair do patamar de templo de crenças e assumir sua feição de escola capacitadora de virtudes e formação do homem de bem, independentemente de fazer ou não com que seus transeuntes se tornem espíritas e assumam designação religiosa formal.

Elaboremos um programa educacional centrado em valores humanos para dirigentes, trabalhadores, médiuns, pais, mães, jovens, velhos, e o apliquemos consentaneamente com as bases da Doutrina.

Saber viver e conviver serão as metas primaciais desse programa no desenvolvimento de habilidades e competências do espírito.

O que faremos para aprender a arte de amar? Como aprender a aprender? Como desenvolver afeto em grupo? Como “devolver visão a cegos, curar coxos e estropiados, limpar leprosos, expulsar demônios”?

Muitos adeptos conhecem a profundidade dos mecanismos desencarnatórios à luz dos princípios espíritas, entretanto, temos constatado quantos chegam por aqui em deploráveis condições por não se imunizarem contra os padrões morais infelizes e degeneradores.

A melhoria das possibilidades do centro espírita indiscutivelmente facilitará novos tempos para o pensamento espírita, haja vista que estaremos ali preparando o novo contingente de servidores da causa dentro de uma visão harmonizada com as implicações da hora presente. Dessa forma, estaremos retirando a Casa da feição de uma “ilha paradisíaca de espiritualidade”, projetando-a ao meio social e adestrando seus participes a superarem sua condição sem estabelecer uma realidade fictícia e onerosa, insufladora de conflitos e de medidas impositivas, longe das reais possibilidades de transformação que a criatura pode e precisa efetivar em si mesma.”

Cícero Pereira (1)

(1) Trecho extraído da mensagem “Atitude de Amor” inserida na obra “Seara Bendita’ psicografada por Maria José da Costa Soares de Oliveira e Wanderley Soares de Oliveira — Diversos Espíritos - Editora INEDE.

Fim

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